TUTELA - TRAMITAÇÃO
ORIGEM : 9ª Vara Federal de Pernambuco
REQTE : UNIÃO
REQDO : JUÍZO DA 9ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO (RECIFE)
PARTE A : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PART INT : CBTU - COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS
ADV/PROC : CLAUDIA GUERRA OLIVEIRA DA COSTA e outros.
0006784-60.2013.4.05.0000 RELATOR : DESEMBARGADOR (A) FEDERAL PRESIDENTE ORIGEM : 9ª Vara...SL 4453-PE_1 (p. 2) A União Reconhece que a pretensão dos trabalhadores da antiga rede ferroviária encontra legitimidade - SL 4453-PE.
DECISÃO
Cuida-se de pedido de suspensão de tutela antecipada formulado pela União em face de decisão prolatada pelo il. Juízo da 9ª Vara da Seção Judiciária de Pernambuco, nos autos da Ação Civil Pública nº 0006489-96.2006.4.05.8300.
Aduz que referida demanda foi proposta pelo Ministério Público Federal com vistas à obtenção de provimento jurisdicional que determine a incorporação dos trabalhadores do antigo grupo Rede (RFFSA, CBTU e TRENSURB), de modo a assegurar-lhes o exercício de funções típicas de policiais ferroviários federais, titulares de cargos públicos e regidos pelo regime jurídico estatutário.
Anota ter sido realizada, em 27.2.2013, por parte da Polícia Federal em Pernambuco, uma operação (denominada "Platão") na qual foram presos, em flagrante, 23 (vinte e três) funcionários da antiga Rede, por se encontrarem armados e exercendo atividade típica de policiamento ostensivo.
Esse incidente, segundo esclarece, teria impulsionado o MPF a renovar o pedido de liminar outrora formulado naquela ação civil pública, cujo trâmite, até então, encontrava-se suspenso por decisão do próprio Juízo, o qual acolhera o argumento da União no sentido de que seria prudente aguardar o julgamento de ação direta de inconstitucionalidade recentemente proposta.
Relata que, finalmente, foi deferida a liminar ora vergastada, onde se determinou que "tanto Companhia Brasileira de Trens Urbanos/CBTU como a União garantam o exercício, no território pernambucano, pelos substituídos processuais oriundos da Rede Ferroviária Federal antes da vigente Constituição, do Policiamento ostensivo ferroviário federal, inclusive com usos de arma de fogo, a exemplo do que ocorre com os agentes policiais do Departamento de Polícia Federal e do Departamento de Polícia Rodoviária Federal, consoante orientações do Ministério da Justiça, devendo este, para tanto, no prazo de sessenta dias, expedir o correspondente regramento viabilizador do cumprimento da presente medida judicial.".
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Reconhece que a pretensão dos trabalhadores da antiga rede ferroviária encontra legitimidade no texto do art. 29, § 8º, da Lei nº 10.683/2003 (com a redação conferida pela Lei 12.462/2011), no qual resta consignado que os profissionais oriundos do grupo Rede "que estavam em exercício em 11 de dezembro de 1990, passam a integrar o Departamento de Polícia Ferroviária Federal do Ministério da Justiça". Nada obstante, salienta tratar-se de questão complexa, de inviável solução no exíguo prazo de 60 (sessenta) dias, assinalado pela decisão.
Ressalta, ainda, os impactos que decorreriam da incorporação de quase 2.000 (dois mil) ex-funcionários do grupo Rede em um órgão público que sequer foi estruturado originalmente, considerando que somente nos últimos anos foram retomadas as políticas públicas voltadas à construção de novas malhas ferroviárias, cujas obras ainda se encontram em execução.
Acrescenta que a legislação em tela - art. 29, § 8º, da Lei nº 10.683/2003, com a redação dada pela Lei nº 12.462/2011 -é objeto da ADIN nº 4708, proposta pelo Procurador Geral da República, o que, em sua ótica, tornaria a questão ainda mais complexa.
Argumenta, nesse contexto, cuidar-se de decisão que traduz manifesta ingerência do Poder Judiciário na ordem administrativa, em violação ao postulado da separação dos poderes. Referida medida estaria usurpando a prerrogativa inerente à Presidência da República (art. 84, II, VI, a e 165 da CF/88) de dispor do orçamento sobre o Poder Executivo e sobre a organização e o funcionamento da Administração Pública Federal, conforme as necessidades do país.
Conclui, pois, estar-se diante de grave lesão à ordem administrativa, a justificar o deferimento do pedido de suspensão, a fim de evitar-se intolerável tumulto administrativo.
Requer, ao final, seja determinada a imediata suspensão dos efeitos da decisão objurgada, dela retirando a executoriedade, "no sentido de que seja mantida a suspensão da ACP nº 0006489-96.2006.4.05.8300 até o julgamento da ADI nº 4708 ou, sucessiva e alternativamente, até que a União termine os estudos a atos preparatórios para a implementação da Polícia Ferroviária Federal" (fl. 2-15).
É o relatório. Passo a decidir. SL 4453-PE_1
Conforme tenho assentado no exame de feitos semelhantes, a medida de que ora se trata, prevista - dentre outros dispositivos - no art. 4º da Lei nº 8.437/92, está adstrita à análise da ocorrência de aspectos relacionados à potencialidade lesiva do ato decisório em face dos interesses públicos consagrados naqueles preceitos normativos, quais sejam, a ordem, a saúde, a segurança e a economia públicas. Confira-se, porque oportuno, o regramento contido naquele dispositivo legal:
"Art. 4º Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas."(destacamos).
Decerto, consoante se pode inferir, o legislador valeu-se do adjetivo" grave "justamente como forma de evidenciar a excepcionalidade da medida suspensiva almejada, de modo que somente uma avaliação efetiva acerca da gravidade da lesão pode autorizar a concessão legítima da providência reclamada. Nesse sentido, elucidativo é o voto do Ministro do STF, Sepúlveda Pertence, proferido no julgamento do AgRgSS 432-DF, DJU 12.2.1993:
"(...) é medida excepcional de contracautela, destinada à salvaguarda de relevantes interesses públicos sob risco iminente, na hipótese de execução, ainda que provisória, da ordem judicial. (...) O que a singulariza é, precisamente, que esses requisitos do periculum in mora, na suspensão de segurança, são qualificados. Não é qualquer risco que a justifica, não é qualquer possibilidade, não é, nem mesmo, a probabilidade de um risco qualquer: é apenas o risco de grave dano a interesses públicos relevantíssimos. (...)"
Com efeito, na apreciação desse instrumento extraordinário, o Judiciário deve agir com extrema cautela, pois, nos pedidos de suspensão, não há que se cogitar de lesão à ordem jurídica nem, tampouco, de exame de questões relativas o próprio mérito da controvérsia, sabido serem matérias suscetíveis ao debate nas vias recursais ordinárias, instrumentos que ressabidamente permitem a verificação do acerto ou desacerto da decisão impugnada.
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Feitas essas considerações iniciais, passo à análise do caso concreto, para concluir que a hipótese em apreço encontra-se inteiramente ajustada à orientação acima referenciada, como passo a demonstrar.
A liminar hostilizada tem o seu dispositivo vazado nos seguintes termos:
"(...) Isto posto, deferindo parcialmente a medida liminar postulada, determino que tanto a Companhia Brasileira de Trens Urbanos/CBTU como a União garantam o exercício, no território pernambucano, pelos substituídos processuais oriundos da Rede Ferroviária Federal antes da vigente Constituição, do policiamento ostensivo ferroviário federal, inclusive com uso de arma de fogo, a exemplo do que ocorre com os agentes policiais do Departamento de Polícia Federal e do Departamento de Polícia Rodoviária Federal, consoante as orientações do Ministério da Justiça, devendo este, para tanto, no prazo de sessenta dias, expedir o correspondente regramento viabilizador do cumprimento da presente medida judicial. (...)"(fl. 44) - destacamos.
É sabido que a Constituição da República previu, em seu art. 144, que a segurança pública,"dever do Estado, direito e responsabilidade de todos", é exercida, dentre outros órgãos, pela"polícia ferroviária federal"(inciso III). Não se pode perder de vista, no entanto, que o § 3º do mesmo dispositivo assim preceitua:
"§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais."- destacamos.
Trata-se, a olhos vistos, de carreira ainda pendente de estruturação, conforme já assentou eg. Supremo Tribunal Federal, nos autos do Mandado de Injunção nº 627/SP, da relatoria do em. Min. Néri da Silveira, cuja ementa segue transcrita:
"EMENTA: - Mandado de injunção. Regulamentação do art. 144, inciso III, e art. 144, § 3º, da Constituição Federal, no que tange à necessidade de estruturação da carreira de Policial Ferroviário Federal. 2. Interessados não detêm condições de titulares de cargo público no exercício de funções policiais ferroviários. 3. Falta de legitimidade ativa ad causam dos associados do suplicante. 4. Mandado de injunção não conhecido."(DJ 21.6.2002, p. 97) - destaque do original. SL 4453-PE_1
Extrai-se, desse julgado, esse pertinente excerto do voto do relator:
"(...) Os associados do requerente não detêm cargo público, mas são empregados das ferrovias e esperam a criação da carreira. Não se configura, entretanto, a hipótese do art. 5º, LXXI, da Constituição. Se é certo que a carreira está prevista na Constituição Federal, a ser criada, na forma da lei, não há exercício de direito dificultado pela falta da norma que se reclama, pois não detêm os interessados condição de titulares de cargo público no exercício de funções policiais ferroviários. O fato de a Constituição prever se organize a polícia ferroviária federal pela União Federal e se mantenha sua estruturação em carreira, não resulta disso estarem os associados do requerente na posição de titulares de direitos, liberdades ou prerrogativas constitucionais que lhe ensejem legitimidade a requerer mandado de injunção (CF, ART. 5º, LXXI). (...)"- destacamos.
Em harmonia com esse entendimento, a col. 2ª Turma deste TRF da 5ª Região, no julgamento da Apelação Cível nº 480915/PE, da relatoria do em. Des. Fed. Convocado Manuel Maia, assim decidiu:
"ADMINISTRATIVO. POLÍCIA RODOVIÁRIA (sic) FEDERAL. REGULAMENTAÇÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO DO ART. 144, § 3º, DA CRFB. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REDUÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Ilegitimidade ativa ad causam da Associação Autora para pleitear o afastamento de todos os funcionários terceirizados da CBTU - Companhia Brasileira de Trens Urbanos do exercício de atividades inerentes à carreira da Polícia Rodoviária Federal.
2. A categoria da Polícia Ferroviária Federal, embora prevista pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 144, § 3º, ainda não foi regulamentada. Dessa forma, a associação Recorrente não possui em seu quadro policiais ferroviários federais, tendo em vista a própria inexistência dos referidos cargos e carreira na Federação brasileira. Precedentes do STF.
3. Inexistindo condenação, de ser aplicado o § 4º do art. 20, que prevê sua fixação consoante apreciação eqüitativa do juiz. Considerando a complexidade e as circunstâncias do feito, atentando-se, ainda, para a atuação do profissional e as peculiaridades da causa, com base na razoabilidade e na proporcionalidade, reduz-se o valor dos honorários advocatícios para R$ 1.000,00 (mil reais).
4. Apelação parcialmente provida."(DJe 20.8.2010) - destacamos. SL 4453-PE_1
Na hipótese dos autos, considero que a decisão judicial que autoriza os substituídos processuais a exercer atividades típicas de policias rodoviários federais, nas mesmas condições dos policiais do Departamento de Polícia Federal e do Departamento de Polícia Rodoviária Federal, inclusive com o uso de arma de fogo, traduz clara agressão à ordem pública (em sua acepção administrativa), uma vez que representa o exercício, per saltum, da atividade administrativa.
Nesse contexto, malgrado o Magistrado insista em tratar os substituídos processuais como "policiais ferroviários federais, apesar da ausência de medidas administrativas que assim os considere" (fl. 43), resulta inegável, à vista do exposto, que o cargo em questão, juridicamente, ainda não existe em nossa federação.
É certo que a Lei nº 10.684/2003, em seu art. 29, § 8º (com a redação conferida pela Lei 12.462/2011) expressamente estatui que os profissionais oriundos do grupo Rede "que estavam em exercício em 11 de dezembro de 1990, passam a integrar o Departamento de Polícia Ferroviária Federal do Ministério da Justiça". Nada obstante, essa incorporação, por óbvio, não pode ter lugar antes da criação e estruturação do próprio departamento, segundo a conveniência e oportunidade próprias da atividade administrativa.
Admitir-se uma decisão nesses moldes representaria a chancela a uma manifesta ingerência do Poder Judiciário na ordem administrativa, em rota de colisão com o princípio constitucional da separação dos poderes da República, retirando do Poder Executivo a discricionariedade no manejo de seu orçamento, além da prerrogativa de dispor sobre o funcionamento e a organização da administração federal.
Além disso, como bem ressaltado no requerimento de suspensão, a incorporação e absorção de centenas de trabalhadores vinculados às empresas do antigo grupo Rede a um órgão público ainda em fase de implemento demanda "uma complexa análise de necessidade, proporcionalidade, disponibilidade orçamentária e eficiência, não podendo ser objeto de valoração pelo Poder Judiciário" (fl. 15).
Outro ponto oportunamente ressaltado pela AGU diz respeito ao perigo de se ter um sem-número de indivíduos autorizados a andar armados, com poder de polícia, em contato direto com a população usuária do serviço público ferroviário, como consequência, ainda uma vez, da decisão judicial ora em discussão, quando sequer possuem habilitação para tanto. SL 4453-PE_1
Nessa quadra, penso que, ao pretender compelir a União e a CBTU a garantirem, no prazo de 60 (sessenta) dias, o exercício, pelos substituídos processuais, da atividade de policiamento ostensivo ferroviário federal, o Magistrado está substituindo, por seus próprios critérios de escolha, as opções legítimas que devem ser feitas, a seu tempo, pelo Poder Executivo Federal, com base em razões de oportunidade e conveniência.
Por último, impende observar que, nada obstante seja factível a suspensão dos efeitos da liminar atacada, "até o trânsito em julgado da decisão de mérito na ação principal" (art. 4º, § 9º, da Lei 8.437/92), não vejo espaço para que "seja mantida a suspensão da Ação Civil Pública nº 0006489-96.2006.4.05.830 até o julgamento da ADI nº 4708", conforme pretende a requerente (fl. 15).
É que a continuidade daquela ação civil pública - que se encontrava suspensa há longa data - não foi determinada por conduto da liminar ora questionada, mas em decisão apartada. Ademais, as razões que levaram o douto Juiz Federal a dar prosseguimento ao feito são de ordem puramente processual, não se confundindo, por conseguinte, com a extensa fundamentação que ensejou a tutela de urgência aqui combatida. Não bastasse, a ora requerente não se deu ao trabalho de demonstrar como poderia o simples trâmite daquela demanda proposta pelo MPF, por si só, acarretar algum risco à ordem pública.
Assim, DEFIRO, com supedâneo no art. 4º, § 8º, da Lei nº 8.437/92, o pedido de suspensão da liminar concedida pelo Juízo da 9ª Vara da Seção Judiciária de Pernambuco, nos autos da Ação Civil Pública nº 0006489-96.2006.4.05.8300, até o trânsito em julgado da sentença a ser ali proferida.
Comunique-se com urgência o inteiro teor deste decisum ao nobre Juízo prolator da decisão vergastada.
Publique-se. Intime-se.
Recife, 8 de julho de 2013.
FRANCISCO WILDO LACERDA DANTAS
Desembargador Federal Presidente
LIMINAR
Com o objetivo de garantir o direito da parte de um processo logo no início, a liminar é uma ação importante dentro do direito, que pode literalmente ser a diferença entre a vida e a morte de um cidadão que busca os seus direitos.
Ela faz com que a pessoa tenha acesso aos seus direitos de um processo, geralmente conquistados no término do mesmo, antes de todas as etapas acabarem.
O pedido está previsto no artigo 300 do Novo Código de Processo Civil (Novo CPC), como Tutela de Urgência.
Parágrafo Novo
ANAPFF.OFICIAL


